O futebol tem seu tempo próprio, onde as distâncias não existem – você é teletransportado num segundo. Mal acabei de acordar e Daniel Bouzada me lembrou que hoje é dia de Assis. Faz trinta e oito anos que o eterno camisa 10 de 1983 entrou para a história do Fluminense.
O Fluminense tinha um timaço, ganhou a Taça Guanabara, perdeu o treinador e foi para o triangular final, onde não brilhou na estreia. Empatou com o Bangu em 1 a 1 no primeiro jogo e o Fla x Flu era a última chance de título. Mesmo no clássico imortal, o jogo não foi espetacular e nem precisava, pois era hora de brigar pelo título. O empate colocaria o Fluminense na lona, só a vitória interessava.
Com idas e vindas no Fla x Flu equilibrado, o gol não saía e, principalmente no segundo tempo, com poucas oportunidades, a maioria coube ao rival. Mas estava escrito e, no último ato da partida, o lançamento espetacular de Deley colocou Assis livre pela direita, que entrou na área e tocou mansamente na saída do goleiro Raul, este em seu último jogo como profissional. Catarse no Maracanã: tricolores enlouquecidos, gente voltando das rampas depois de ter saído minutos mais cedo, lágrimas, comoção e um tipo de sentimento que se repetiria em 1995, no Fla x Flu do gol de barriga.
Contudo, o gol de Assis eliminou o Flamengo do título, mas não garantiu a conquista tricolor, ao contrário do que sugere imaginário popular. Era preciso que o Flamengo pelo menos empatasse com o Bangu na partida final do triangular, disputada três dias depois. Incrivelmente, o Rubro-Negro impôs seriedade máxima, venceu por 2 a 0 e garantiu o título para as Laranjeiras. E Assis, contratado meses antes sob dúvidas, se tornou o único jogador da história do Maracanã a tirar dois títulos consecutivos de um rival – repetiria o feito em 1984, com uma cabeçada fantástica e consagrando o bicampeonato tricolor.
Talvez seja difícil para os mais jovens entenderem a grande comemoração pelo Carioca, hoje esvaziado. Acontece que nos anos 1960 até 1990, ele era a principal competição do país, com recordes sucessivos de público e crítica. E, na pequenina parte que me toca, com quinze anos de idade, eu pulei demais com a vitória. Não me lembro sequer de como voltei para casa ou o que jantei: o que sei é que pulei, pulei e gritei para que o mundo inteiro ouvisse. Foi Assis quem quebrou uma série de três anos difíceis, de muitas vaias e muita cobrança da torcida, levando o Fluminense ao início de uma era virtuosa, com um time tão poderoso que, mesmo depois do tri estadual e do Brasileirão 1984, ainda continuou disputando títulos até perto do fim dos anos 1980.
Não havia festa pelo sétimo lugar, apenas pelo primeiro. Eram outros tempos, outras palavras.
Arte: Daniel Bouzada