Eu, Heleno Sotelino e Chiquinho (por Paulo-Roberto Andel)

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Outro dia mesmo a gente jogou um campeonato de botão em Vila Isabel. Fizemos a final. Jogo duro, consegui ganhar e, entre biscoitos e coca-cola, perguntado sobre o título, disse o Heleno: “Eu me considero campeão, porque o Andel é profissional”. E rimos abraçados.

Lá em casa tem um abridor de garrafas tricolor, presente dele.

Dividimos almoços, jantares, churrascos. Ele foi um dos tricolores mais presentes aos meus lançamentos de livros, sendo que nunca economizava elogios aos meus rascunhos, o que me dava uma alegria imensa. Generoso ao extremo.

A gente não concordava em tudo; aliás, discordava em muitas coisas, só que amigo que não discorda ou é claque ou é bajulação. De resto, bem dito ontem pelo querido amigo Miguel Pachá, o Heleno era um gentleman, um lorde na acepção das palavras, daqueles que não se vê mais por aí em tempos de ódio gratuito. Em suma, um autêntico tricolor.

Amante do samba, da literatura, das artes, dos botecos, era um papo para horas, com um senso de humor preciso.

Nos últimos tempos, uma das nossas diversões era conversar no WhatsApp sobre Chiquinho Zanzibar, este personagem que atordoa a lida política do Fluminense, como se houvesse se apenas um único homem com as suas características um tanto exóticas – cá entre nós, o que não falta ao Fluminense atual é gente exótica, vide as redes antissociais. E, claro, ríamos muito com as histórias inusitadas do suposto conselheiro tricolor. Uma vez me perguntaram “Cara, quem é o Chiquinho Zanzibar?”, respondi “Sei lá, só no clube tem uns trinta ou quarenta! Pergunta a Alva”.

Enfim, ontem eu estava doente a ponto de não ficar no trabalho, coisa raríssima em 26 anos ininterruptos. Voltei para casa com febre, cheio de dor, fiquei deitado a tarde toda praticamente sem me mover, até que veio o WhatsApp de novo e, desta vez, não tinha nenhuma piada, brincadeira, anúncio de campeonato de botão ou outra agenda da gentebonice. Era a notícia da passagem do Heleno: veloz, abrupta, sem tempo para dizer nada, até porque tudo já estava dito e vivido em inúmeras conversas, abraços e drinques.

Neste vale de lágrimas que virou o Brasil, a minha quarta-feira ficou pior. Meu amigo Heleno foi embora. Estou triste, estou puto, estou chorando mas, ao mesmo tempo, me vem a imagem de um amigo sorridente, um típico carioca de sempre, um irmão de arquibancada, um escudo do Fluminense dentre tantos que escrevem as grandes e as pequenas histórias do nosso amor em três cores imortais a cada dia. É isso.

Panorama Tricolor 

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Foto: Silvio Almeida