A gestão Peter Siemsen transformou o Fluminense em um eunuco do futebol brasileiro. Em seis anos, o Fluminense de Siemsen ganhou um estadual e um brasileiro, em 2012, ganhou a Primeira Liga esse ano e nada mais. Há quem confunda as coisas e ache que o título brasileiro de 2010 também aconteceu na gestão Siemsen, mas a única e indisputável verdade é que aquele triunfo coube ao presidente anterior, o folclórico Roberto Horcades.
São quase seis anos e três míseras taças, sendo apenas uma nos últimos quatro anos (o que abrange todo o segundo mandato de Siemsen). Disputamos, nesse período de seis anos, nada menos do que seis Taças Guanabara, seis Cariocas, seis Brasileiros, três Copas do Brasil, três Libertadores, duas Copas Flórida e a Primeira Liga. Foram 27 taças em jogo e ganhamos três. Fora as conquistas, estivemos em finais apenas nas Taças Guanabara de 2014 e 2016 e em uma semifinal da Copa do Brasil, ano passado. Não fomos vice-campeões estadual, brasileiro ou de qualquer outra coisa.
Atualmente, somos quinto no Brasileiro e temos chance de classificação para a Libertadores – que deveria se chamar Libertinagens, considerando a nova regra. Tem gente satisfeita com isso, o que é absolutamente espantoso. O Fluminense está a 14 (quatorze, isso mesmo) pontos do líder do campeonato. Seriam cinco rodadas para ultrapassar o líder, com a condição de que ele não vencesse partida alguma. Isso é uma performance digna de outro clube centenário, a Ponte Preta, que jamais ganhou uma singela taça. Do Fluminense, espera-se a briga pelo título até as últimas rodadas, quando não a conquista.
Os fanáticos defensores da gestão atribuem toda a culpa à herança maldita. Seis anos depois da saída de Roberto Horcades da presidência do clube, a culpa ainda é atribuída a ele. Quando não é atribuída a Horcades, fala-se da influência maligna de Celso Barros, da oposição canalha e oportunista, da política sacana da Ferj, da perseguição do Vasco, da torcida que não apoia etc. etc. etc. Todos são culpados, menos o atual presidente e seus correligionários. Esses nunca erraram. Ao contrário, lutaram bravamente, obstinadamente, contra poderosos inimigos. São, na verdade, heróis tricolores.
Esses heróis de barro ressaltam a melhor condição financeira do Fluminense. Ressaltam o ganho patrimonial e estrutural representado pelo CT, falam em certidões, em documentos, em balanços e, agora, em estádio. Os redentores do Flu falam até, sabe-se lá por que, no tal do Samorin, como se fosse um plano extraordinário despejar dinheiro num timeco da segundona da Eslováquia (a troco de quê?).
Não há apenas mentira ou manipulação nisso tudo. Houve avanços, todos sabem, e eles são fruto inegável da gestão Peter Siemsen. Parabéns ao presidente pelos avanços, que também existiram nas gestões Horcades (comandante de grandes conquistas no futebol) e, sobretudo, David Fischel (a quem devemos o reerguimento do clube após queda à série C).
Acontece que o Fluminense é um clube de futebol e o sucesso de uma administração não pode dispensar o resultado em campo, ou relegá-lo ao segundo plano em favor de presumidos efeitos de longo prazo. Com diz o competente analista tricolor Dedé Moreira, da Flupress e do interessantíssimo Futebolzinho, se o Fluminense fosse um hospital, as contas estariam no azul, mas os pacientes estariam todos morrendo.
Seja como for, o fato é que hoje o Fluminense é como água de salsicha, capa de guarda-chuva, brinde de festa infantil. O Fluminense compõe o campeonato como um daqueles exercícios obrigatórios da ginástica artística que nada acrescenta em termos da pontuação final. É uma realidade triste, arrasadora, lamentável para todos aqueles que têm uma mínima noção da grandeza histórica do clube.
O pior é que a gestão Siemsen deixará uma herança pesada para o sucessor justamente nesse terreno, o futebol profissional. Siemsen deixará um elenco inchado, cheio de jogadores péssimos com contrato longo e salário alto. Na média, fraquíssimo. Apenas para recordar, temos no plantel os seguintes jogadores (entre parênteses, o tempo de contrato): Maranhão (2019), Giovanni (2018), Henrique (2018), Henrique Dourado (2020), Pierre (2019), Dudu (2019), William Matheus (setembro 2017) Osvaldo (dezembro 2017), Danilinho (setembro 2017), Wellington Silva lateral (2019) e ainda, retornando de empréstimo, Artur, Felipe Amorin, Wellington Paulista. Isso para ficar numa lista reduzida. Vai ser uma luta para o próximo presidente, seja lá quem for, organizar uma barca com metade dessa bem remunerada equipe bizarra.
Siemsen também deixa outro legado maldito para o futebol tricolor: o quase rebaixamento de 2013 e, sobretudo, o linchamento moral a que temos sido submetidos desde então. O Fluminense já tinha conseguido a façanha de colocar a trágica década de 90 em segundo plano no senso comum quando se tornou o time a ser batido entre 2008 e 2012. Toda vez que o Fluminense entrava em campo durante esses anos percebia-se que estava ali um gigante que poderia conquistar a vitória e lutar pelo título.
É de grandeza que estamos falando. A cada fracasso no campo, promete-se grandeza para o futuro. O futuro não se constrói arrasando o presente. Não é possível que a única maneira de estruturar o clube seja abrindo mão dos resultados no campo. O gasto mal feito no departamento de futebol neste ano – uma fortuna foi torrada na contratação de um monte de jogador ruim – desmente a necessidade de arrasar o presente. O Fluminense não pode virar água de salsicha para depois voltar a ser grande. A eternidade tem de ser exercida diariamente.
Panorama Tricolor
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Imagem: jole