FRIDAY NIGHT
Sexta-feira à noite e meu telefone toca na hora em que me reparo para ver TV e relaxar depois de uma intensa semana de trabalho: notícias, contas, pessoas desagradáveis, vida. Quando vejo, lá vem a mona da cafajestagem na tela do smartphone. Minha rainha diaba, minha Madame Satã de Álvaro Chaves.
Chiquinho Zanzibar falando em verdadeiro êxtase, a ponto de eu sentir do outro lado do fone a sua gesticulação quase esquizofrênica. E dessa vez não tinha muito a ver com suas tradicionais ânsias por negociatas, mamatas e oportunidades de trambique. Quero dizer, não por enquanto, pois um picareta como ele sempre vai aprontar alguma na próxima esquina.
Primeiro, estranhamente animado com o jogo do Fluminense em Edson Passos. A ponto de deixar todos os seus preconceitos espúrios de lado, mudar de opinião e resolver ir ao jogo na Baixada Fluminense. Contou-me que Boris, um amigo das Laranjeiras, antigo frequentador da Alaska 1977, dispôs-se a reservar um Uber para a ocasião. É CLARO que o rei das mamatas não ia perder uma oportunidade dessas, ainda que não possa usar seu echarpe grená para a ocasião:
“Inhaí, queridona? Desculpe, Alvérrima, mas desta vez vou com total discrição. Eu, Boris e o motorista Clayton que, vou te contar, é um dumdum daqueles de abalar estruturas. Você sabe que não é bem o meu feitio, mas às vezes, quando o prato é saboroso, concedo a mim mesmo algumas pequenas contradições. RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ. Ele parece um daqueles deuses de ébano dos musicais da Broadway, meus sais! Tudo bem que esse jogo é lá no quinto dos infernos, mas eu não vou ficar perto da gentalha: o Boris tem um esquema lá. Só espero que não tenha escurecido muito ao sair de lá, porque… CRUUUUUUZES!, é um perigo danado. Se bem que o dumdum impõe respeito na condução, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ. Mas eu vou no sapatinho, acho até que Esmeralda vai comigo, isso se ela não tiver aula de tênis com o professor Marcondes.”
“Só espero não passar perto desses blogueiros sujos, comunistas de merda. Se eu pudesse, mandava proibir todos eles. Quem é essa gentalha para querer posar de jornalista e escritor? Só me faltava essa. Não chegam aos pés de um Reinaldo Azevedo ou Marcantonio Villa. Jabor? Nem pensar? São uns metidinhos a besta que usam a internet para pegar mulher, cruzes! Sei que lá é o lugar de pobres que nem eles, mas confesso que estou animado. Chegando lá, eu nem olho para o lado, só me concentro nos bofinhos do gramado, mas sem dar bandeira que a Esmê não merece. Tem também um ou outro bofão da arquibancada, mas só de olhar 43.”
“Ai, amiga, nem te conto: um babado forte desses lá no clube, estive na sauna ontem. Disseram que um desses garotos da internet, daqueles que se acha proprietário do Fluminense, foi visto na Augusto Severo, ali perto da Lapa, sabe?, conversando com a Enfermeira, que é uma trans lourinha de óculos, conhecida, sempre de branco. Pegou na mão dela e tudo. Esses bofes ficam pagando de machões no computador e se revelam tão doces quando é o amor que não ousa dizer seu nome, sabe? E depois ficam esses ebós na televisão falando de cura gay, santa hipocrisia. RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ.”
Quero saber das novas, se tem alguma coisa que preste para o Fluminense, as novas contratações. Então aquele êxtase vira uma completa ferveção bate-estacas como se estivéssemos num club das absurdettes:
“Meodeuz, você não sabe? Chegou o Danilinho vai causar calooooooooooooores, Alveta! Daqueles bofes de meia altura sargentão, sabe? Nem foi anunciado e já partiu pra dentro com tudo. Do tipo que impetuoso, cheio de confiança, bofinho dos bons que acha que sabe tudo, mas também meio bolachinha, poc poc. Arruma pegação, é metido com padê, só nas emoções. Acho que vem para abalar Bangu, Campo Grande e Santa Cruz juntos, céus! RÁ, RÁ, RÁ, RÁ. E ele gosta de confusão, noitada, é dos meus. Tou louco pra pedir um autógrafo. E se der, espaço, já viu… RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, tou precisando de um escravinho para atender às minhas ordens. Mas esse time tá precisando mesmo de um safadão pra sacudir o vestiário e a sauna. Tem muito bonzinho, muito menino de Deus, eu quero é o Diabo! Ai, e esse nome ainda me traz um gosto de beijo na boca, senhor: foi tudo por amor, tudo por loucura, mas eu gostei.”
E o Wellington Silva 2? A tia má só tem olhos para o outro:
“Ai, Alva, deixa de ser cafona. Se o garoto vier, que melhore essa pomba de time e que eu possa faturar meu aquezinho. Mas você acha que precisa? Eu quero é cantar: “Vem, Danilinho, vem, Danilinhoooooooo! O outro tem cara de pobre, não tenho confiança.”
Hora de desligar, agradeço, escuto ainda um monte de bobagens e a ligação termina sem que eu precisasse ficar desesperada com as sandices da eugenia chiquínica. Penso na pobre Esmeralda:
“Mona, assim que você estiver no Rio a gente precisa se ver. Quero contar uns babadões daqueles que não podem ser contados no telefone nem na internet. Papo sério de um cotrofe lá do clube, de arrepiar. Beijo no coração, vida! Deixa eu ir que tá cheio de MD no Twitter pra mim, vai que tem uma emoção diferente?”
Ainda me pergunto: o que é que esse sujeito tem na cabeça?
Como se deu a formação dessa personalidade?
Por que não dar uma guinada, assumir sua sexualidade de vez, parar de enganar de vez a esposa, deixar de lado essa espécie de represamento dos sentimentos e libertar-se?
Mas é pouco, muito pouco diante da principal mudança: a de seu caráter volúvel, interesseiro, bajulador e oportunista. Parece que as duas coisas, a sexualidade e o caráter, sem julgamento, estão misturadas como se fossem uma coisa só.
Chiquinho sexualiza o mundo de acordo com seu caráter. Quanto maior o escroque, parece maior a paixão.
Por outro lado, será que Esmeralda sabe que dorme diariamente com um safado, um pilantra que a engana em nome de emoções diferentes, um sujeito que nem fala do filho, de família, nem sequer diz que está triste com a fase do Fluminense, resumindo o sentido da vida a picardias homoafetivas e picaretagens financeiras?
Onde foi que eu me meti para contar esses causos?
BREAKFEST
Acordo, a réstia de luz entre a brecha das cortinas me incomoda, sem olhar aperto o botão do smartphone e começam a pipocar mensagens. A primeira, maior, é do Zanzi. Começo a ler:
“Alva, meu bem, queria te pedir desculpas. Sei que às vezes eu pareço um tanto quanto insensível e indiferente aos outros, mas é questão de pragmatismo diante da vida. a gente não pode mudar o mundo e certas convenções, de modo que é preciso adaptar-se a elas. Nem sempre a gente pode ser como é porque a vida é como ela é. Tem que administrar. Eu não sou uma pessoa do mal só porque acho que tem gente superior nessa Terra, mas foi assim desde sempre: temos os especiais, os comuns e o povo. Quando não foi assim? Acredite: eu amo minha esposa e minha família, mas de um jeito especial, todo meu, que nem sempre é fácil de ser compreendido. E amo o Fluminense, mas também do meu jeito. Estamos num país democrático, não é? Então cada um pensa de um jeito. Fui bem criado, tenho berços, boas fronhas, lençóis, talheres, por que teria que abrir mão disso? Enfim, sei que pareço confuso às vezes por causa desse meu jeito estúpido de ser. Obrigado por ser minha confidente, amiga e conselheira, mesmo que eu não faça absolutamente nada do que você recomenda. Todos nós vivemos num grande armário da alma e cada um sai do seu jeito mais aprazível. Adoro conversar contigo e só te peço sigilo em relação aos nomes, porque são pessoas importantes, conhecidas, respeitáveis e não quero que nada macule o nosso clube, ok? Fique com Deus, semana que vem nos falamos. Deixa eu descer que o filhote está aqui na porta: vamos lá para a Praia da Reserva, meudeuz! Rá, rá, rá, rá. Beijo na sua alma.”
Panorama Tricolor
@PanoramaTri
Imagem: ba
#NãoSouFake
#NãoEnchaOSaco
#CensuraÉOCacete
Contém trechos de “Uivo”, Allen Ginsberg, 1956
Gostei!
Me lembrou, talvez não seja do seu tempo, de um senhor escritor chamado Sérgio Pôrto, que tinha o pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta em suas crônicas.
Fiquei seu fã. Vou te acompanhar.
Boa contratação do Panorama.
Espero que o Flu também tenha acertado nas contratações.
ST.
Alva: Muito obrigado, Carlos. Espero que você goste do livro. ST.