Os Bancos são locais onde tradicionalmente as pessoas costumam desabafar suas angústias enquanto aguardam atendimento. Acostumado a essa prática, não estranhei quando, sexta passada, numa agência bancária, um senhor diante de um caixa eletrônico começou a esbravejar palavras impublicáveis. Imaginei logo tratar-se de impropérios contra os terríveis banqueiros, suas criações e o descaso costumeiro com a clientela.
Intrigado e curioso por descobrir o motivo da irresignação daquele homem, que já atraía a curiosidade de bastante gente ao seu redor, dirigi-lhe a minha atenção. Xingava, bradava e procurava alguém que lhe desse ouvidos. Olhou em minha direção e, para não desapontá-lo – e também para mostrar minha insatisfação com os serviços bancários, mesmo sem ainda saber qual deles era o motivo da sua ira – assenti com um sorriso chocho, sinal que, para ele, foi suficiente para despejar sobre mim a causa de seu desatino:
– “Ta vendo isso! Bando de f…Olha ali, olha ali! Que demora!”, apontando para o caixa eletrônico.
Observei, então, para ver o que tanto o irritava. O display do aparelho mostrava um ícone rodando rapidamente ao redor de seu próprio eixo e, ao lado, o aviso: “Operação em processamento”.
Então entendi que aquele senhor, dentre todas as reclamações que poderia fazer – e não seriam poucas: tarifas bancárias, usura dissimulada, impostos, lucros exorbitantes dos banqueiros etc – escolheu reclamar do processamento de sua solicitação que, para ele, extrapolara o limite do razoável.
Enquanto incrementava o repertório de suas ofensas, um cliente o cutucou alertando-o de que o dinheiro solicitado já estava disponível. Virou-se, então, rapidamente, pegou o dinheiro e saiu, deixando para trás apenas os ecos de sua revolta.
E então me veio a inevitável comparação com a realidade do atual Fluminense e as suas “operações em processamento”, questiúnculas que, exageradas, ganham a preferência do torcedor no quesito reclamação. Assim como no caso daquele cliente, muitos de nós enxergamos apenas os problemas mais aparentes, que nos afligem diretamente e nos esquecemos do restante do “iceberg”.
Evidentemente, Cristóvão, Drubscky e Enderson foram malfadadas apostas que não deram resultado. Pudera, nenhum deles tinha currículo para ser treinador do Fluminense e, se um deles funcionasse, certamente seria obra do acaso. E aí está a “operação em processamento” que tanto nos irrita. E irrita tanto que deixamos de buscar a causa do descaso, o motivo pelo qual fomos submetidos à inépcia desses profissionais, para bradarmos contra treinadores ou mesmo jogadores inabilitados.
É preciso enxergar mais longe para perceber que se há um Drubscky, é porque alguém o trouxe. Se há conflitos internos, é porque quem deveria controlá-los é pusilânime. Se há dívidas, é porque quem deveria zelar pela ordem financeira do clube não o faz.
Observar e criticar somente o efeito é uma opção simplista demais. É preciso buscar a causa.
Nem tudo, porém, é divulgado pela imprensa. Nem todos têm acesso às informações privilegiadas que vêm do clube, mas nem por isso se deve aquiescer parcimoniosamente. Um pouco de sensatez nos permitirá concluir que o problema não está apenas no que é visível, mas está sobretudo naquilo que não podemos ver. Não podemos ver, mas podemos sentir.
O Fluminense precisa de uma reestruturação profunda em seu departamento de futebol, que já demonstrou ser inepto e omisso, sem capacidade para fazer as melhores escolhas técnicas e sem pulso para controlar as insatisfações internas, quando ocorrem – e em todos os clubes elas ocorrem, mas são incêndios apagados sem que, na maioria das vezes, extrapolem as suas paredes. Talvez essa seja a explicação das quedas vertiginosas de rendimento da equipe nos últimos anos, de times que vinham bem e, subitamente, protagonizaram inenarráveis vexames.
Trocar treinadores é medida paliativa. E se são trocados com frequência é porque foram mal escolhidos. Responsabilidade de quem os escolheu.
Eduardo Baptista é o novo nome. Outra aposta, pois um título pernambucano e uma copa do Nordeste não podem credenciar ninguém a ser treinador de um grande clube como o Fluminense. Particularmente, contudo, essa aposta me parece melhor do que as três anteriores e, como sempre costumo proceder, a ele também desejo a melhor sorte, porque quem ganhará com o seu sucesso será o Fluminense.
De qualquer forma, embora me pareça uma boa aposta, Eduardo não é fruto de um projeto. É apenas mais um remendo para salvar o clube dessa queda absurda e preocupante, evitando-se o fantasma do rebaixamento. E o Fluminense precisa de um projeto de retomada das glórias, não de paliativos.
Eduardo Baptista pode dar certo e permanecer no Flu para a temporada seguinte – assinou contrato até o fim de 2016. É o que deve acontecer se conseguir salvar o time do rebaixamento e avançar mais um ou dois degraus na Copa do Brasil, mas nunca será um projeto, nunca terá sido o nome idealizado para comandar o clube de volta às grandes conquistas. Se acontecer, como já disse, será obra do acaso, não do planejamento.
Portanto, o Fluminense de hoje está à mercê das intempéries. Se há um vento bom, navega boas léguas rumo ao seu destino final. Se não há vento, não vai a lugar algum e, se enfrenta uma poderosa tormenta, tende a naufragar.
A solução para esse Fluminense passa necessariamente pelo torcedor, que precisa enxergar além das problemáticas aparentes, da demora da “operação em processamento” que afligiu o cliente impaciente para entender que todo efeito tem causa e que essa causa pode estar na incapacidade de quem atualmente define os rumos do futebol tricolor.
Para esse problema há duas soluções: a atuação firme do presidente do clube renovando o quadro do departamento de futebol e a manifestação do torcedor que, chamado a depositar o seu voto na urna, deposite junto com ele o seu anseio por mudanças profundas na administração do Fluminense Football Club.
O torcedor tricolor precisa, assim, ler as entrelinhas, ser verdadeiramente crítico, consciente e politizado, porque até para reclamar, é preciso saber fazê-lo.
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @FFleury
Imagem: mo
Boas analogias no texto, lucidez presente até o fim. Forma de criticar condizente a um torcedor incomodado,intrigado, indignado, mas não destrutivo. Boa sorte ao Flu, e que reestruturação se faça presente mesmo , mas, que a torcida some em fortalecimento e não suma, porque é deste sumiço que tanto a mídia fomenta, deseja e aplaude . Saudações tricolores!!!