Um dinossauro chamado Ferj (por Paulo-Roberto Andel)

dinossauro

O futebol brasileiro, que outrora tinha ares românticos, amadores e, ao mesmo tempo, produzia craques em escala industrial, aos poucos começou a definhar, maltratado pelas sandices dos dirigentes esportivos, muitos deles pouco afeitos ao jogo de bola, mas servindo a interesses particulares de terceiros.

Antes disso, acredite quem quiser e/ou puder, os campeonatos locais do Brasil eram os mais atraentes, disputados e noticiados – e o carioca era o mais importante deles, ouvido e cobiçado em todo o país.

A Ferj, denominada Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro, foi fundada em setembro de 1978, já com natureza clientelista – em decorrência da descabida fusão dos Estados do Rio de Janeiro e da Guanabara, ocorrida em 1974.

Trinta e seis anos e um quarto no tanque de gasolina. Destes, os primeiros funcionaram bem, ainda que permitindo aberrações como o “tri em dois anos”, ridicularizado por sua própria natureza matemática. Octávio Pinto Guimarães era o presidente, advindo da FCF (Federação Carioca de Futebol) com seu primeiro mandato desde 1967.

Com Octávio, foi vivida a última era de ouro do futebol do Rio, até 1985. Independentemente de suas ligações históricas pessoais, era tido por todos como um dirigente sério, ético, a ponto de nem mesmo sua posterior aliança na CBF com Nabi Abi Chedid ter abalado seu prestígio.

Depois, o sucessor foi o inacreditável dirigente Eduardo Vianna, o Caixa D´Água. Seu primeiro ato como presidente foi trabalhar para impedir o tetracampeonato do Fluminense. Conseguiu: em 1986, as papeletas amarelas explicam mais do que qualquer coisa. Ficou na Ferj até sua morte em 2006, comandando o futebol do Rio amparado pelo jogo político dos clubes do interior, mas também os da capital: era sempre aclamado, sabe-se lá como. Sua ligação com Eurico Miranda transcendeu todos os limites da equidade que o relacionamento da Federação com os clubes deve ter.

Nos primeiros anos da Era Caixa, o campeonato carioca ainda tinha a aragem do começo dos anos 80; depois, situações patéticas aconteceram em 1990, 1998, mesmo 2002 e o que era o campeonato mais charmoso e importante do país foi sendo necrosado até se decompor. Salvam-se 1995 para nós, pelo grande desfecho final com o gol de barriga, e 2001 para eles – tudo por conta da emoção das disputas, não da organização. O resto? Ninguém se lembra, exceto pelos erros bizarros de arbitragem que foram suavizados nas manchetes, exceção ao alvinegro de 1989 (também pela final, não pela competição).

Desde 2006 a Ferj tem como seu donatário o médico Rubens Lopes, egresso do Bangu de Castor de Andrade, sucessor de Caixa D’água no trato desaforado para com o Fluminense, seus dirigentes e sua torcida. Não foram poucas as vezes em que se dirigiu ao Tricolor com rancor, desrespeito e até desprezo. Seu último disparate foi alijar o Tricolor do Maracanã para a estreia no Carioca 2015, em mais uma represália de cunho absolutista. Não há como levar a sério  qualquer dirigente de futebol que, no Rio de Janeiro, exclua o Maracanã do plano das competições oficiais profissionais sob qualquer pretexto . Noutras circustâncias de união das correntes políticas do clube, ações judiciais já pululariam na Ferj enquanto protestos para valer aconteceriam em sua porta.

A cada ano, os torcedores se afastam, os horários das partidas são os mais bizarros possíveis, a disputa é desequilibrada por não haver paridade quanto aos mandos de campo. Os times tradicionais da cidade desapareceram do cenário principal (São Cristóvão, Campo Grande, Portuguesa, América, Olaria etc) enquanto a cada ano, a mistura de má política com futebol traz e retira “promissores” times do interior, geralmente a mando de prefeituras. Estes mesmos times, com parcos recursos, contam com atletas temporários do escalão mais baixo ou recorrem a veteraníssimos. Talvez o Macaé, caso à parte, salve o futebol do Rio da vergonha nas divisões de acesso do futebol brasileiro. E só.

A graça do Carioca estava no charme das torcidas, na disputa dura com os pequenos em seus estádios, no Maracanã lotado às cinco da tarde com a geral fervilhando. Hoje, os mais jovens preferem os jogos eletrônicos do que encarar a pelada na tela da televisão (que passa o jogo do Mário Filho para a própria praça, interessada apenas em suas questões operacionais e transformando as cadeiras num deserto azul).

Estão matando o futebol carioca. Os clubes estão falidos enquanto a bela sede da Ferj, ao lado da Uerj, na Rua Radialista Waldyr Amaral (ele não merecia isso!), ostenta seus garbosos vidros fumês e recebe risonhos executivos engravatados.

Em 30 anos, a entidade teve dois presidentes. Isso talvez ajude a explicar tudo o que aí está em termos de decadência do nosso futebol – uma causa de todas as torcidas. Que não se iludam os que sentam noutras arquibancadas: todos já foram prejudicados em algum momento, uns muito mais e outros, menos.

O que quase ninguém explica mesmo é porque a sigla da entidade passou a ter apenas um F em vez de dois, fazendo jus ao nome de Federação de Futebol. Pode ser que lá este mesmo futebol, paixão de milhões de cariocas e fluminenses, não tenha tanta importância assim.

Ou será que surrupiaram o F em tenebrosas transações?

Nota: Com meu eterno agradecimento, fui mais uma vez convidado do Rock Flu, agora na edição 112, sobre o Pink Floyd. Desnecessário dizer da gratidão a Sérgio Duarte, Gustavo Valladares e Beto Meyer, craques do ramo que ajudam há muito na união da torcida tricolor – tudo o que se pense dos sites e blogs do Flu na internet são, de alguma forma, provenientes do espetacular TT. Pessoas de generosidade ímpar, que servem de exemplo para todos. Segue o link:  http://www.rockflu.com.br/

rock flu 112

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: google

#SejasóciodoFlu

Copa

2 Comments

  1. E pensar que as três estrelas a adornar o nosso escudo fazem referência aos três tricampeonatos de um torneio que já não existe mais…

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