Este texto não é uma crítica ao conjunto da torcida do Fluminense, no qual, evidentemente, estou incluído. Este texto não é uma provocação. Tampouco tem a intenção de fomentar polêmicas. Trata-se apenas do registro do que me parece ser o estado de espírito da maior parte dos tricolores: o espírito desvairado da histeria.
O ano mal começou. Nem mesmo janeiro se foi. Nenhum campeonato oficial de profissionais, em qualquer divisão (ou série, como dizemos agora), iniciou-se no Brasil. O período é de retorno das férias, treinamentos, jogos-treino, amistosos. Mas, já há algum tempo, o período é tomado pela boataria, pela especulação. Isso de um lado.
De outro lado, temos uma torcida escaldada, calejada e, por que não confessar, traumatizada. Estivemos perto do céu e na beira do precipício demais nos últimos anos para não ter suspeitas sobre o futuro próximo. Num mês, as conquistas mais árduas pareciam possíveis ou eram alcançadas de fato; em outro, o breu de um eterno túnel sem luz alguma no fim. Nem bem havíamos levantado a taça de Tetracampeões Brasileiros e lá estávamos sofrendo até a última rodada do Brasileiro – e, pior, ainda mais depois dela.
Fora de campo, os mesmos altos e baixos. Numa entrevista, o presidente fala com confiança do CT. Noutra, descobrimos que só para aterrar sua área teríamos de vender nossa divisão de base inteirinha. Num dia entramos no Refis, no Ato Trabalhista etc. etc., noutro há boatos de novas penhoras, confessos atrasos de salários e inevitáveis vendas de jogadores importantes. Isso tudo alimentado pelo teatro dramático da relação entre o clube e o finado (em qualquer sentido, menos o literal) ex-patrocinador.
A torcida tem razão para ficar à beira da histeria, não? As implicações deste estado de espírito são muitas. Por exemplo, num fenômeno possivelmente inédito na história do futebol, a torcida do Flu quer derrubar o treinador antes do primeiro jogo do ano, só pelos treinamentos. É claro, há também o desempenho fraco do ano passado. Mas ano passado tinha o duplo comando do clube, uma zona danada. Quem sabe agora, com um comando unificado, o treinador não mostra serviço? Movida pela histeria coletiva, a galera do Flu não quer saber de arriscar. Quer a cabeça do cara, embora ninguém saiba exatamente se temos uma alternativa exequível (quem seria?).
Pior ainda é a expectativa pela reformulação do elenco. Tivemos muitas nos últimos anos. A de 2008 para 2009 foi mal sucedida, mas, corrigida em 2010, nos deu um título brasileiro. Nesta vieram Gum, Mariano, Carlinhos, entre outros. Depois mudamos novamente em 2011 para 2012, trazendo Deco, repatriando Nem, Cavalieri e acabamos como tetra numa campanha incrível. Ao contrário, em 2013, tivemos uma manutenção, com os resultados trágicos que todos conhecemos e lamentamos.
De 2014 para 2015, já saíram vários. Quem lamentará de verdade a saída de Fabrício, Valência e Diguinho? Muitos ressentem a ausência de Carlinhos e Bruno e quase todos, pensando no lado da bola, sentirão a falta do maior ídolo dos últimos anos, nosso (meu, pelo menos) querido Conca. Essas ausências, experimentadas a partir do sentimento de histeria coletiva catalisado pelas manchetes sensacionalistas da grande imprensa, convertem-se num fatalista anúncio do rebaixamento em todos os campeonatos, sem exceção. Vamos nos dar mal.
Mas, alto lá. E se Robert estourar? E se Gerson for bem? E se Kenedy repetir mais umas dez vezes aquela atuação magistral do segundo tempo da goleada de 5×2 no Corinthians? E se Fred for Fred? E se Marlon deslanchar de vez? E se Gum voltar à forma de 2012? E se Wagner for o motorzinho do time de novo? E se o tal de Renato for bom de bola, como parece, e um dos dois laterais-esquerdos der caldo? E se o problema de Cristóvão tiver sido a interferência da patrocinadora? E se a Young cumprir a promessa de trabalhar pela união de nossas torcidas? E se a gente der mais um espetáculo na arquibancada do Maracanã? E se as verbas forem liberadas pela procuradoria e acabarem as penhoras? E se a justiça enquadrar a Ferj?
A histeria coletiva é justificada. Mas há motivos concretos para fazer uma terapia (também coletiva), superarmos o trauma e resgatarmos uma marca de nossa torcida e de nossa agremiação: a confiança, o otimismo. É isso que nos diferencia do Botafogo, do Vasco e de quase todos os clubes grandes e pequenos, à exceção, no Rio, do Flamengo, que é otimista por herança genética. Mesmo em momentos muito piores, mantivemos a chama acesa da esperança por um futuro melhor. Por isso, tivemos garra para superar as adversidades e renascer, diversas vezes.
A doença, histeria. A terapia, mais Fluminense. É só sermos nós mesmos que tudo passará.
#SejaSocioDoFlu
Panorama Tricolor
@PanoramaTri
Imagem: literatortura.com
É isso aí, Cael. Às vezes é bom lembrar quem somos nós.
Abraço,
João
Total sentido.
Ainda mais que nossos titulos mais valorizados e com mais cara tricolor, são os conquistados justamente nesses momentos .