Copa do Mundo é, às vezes, um troço irritante.
Normalmente, quando em casa, eu me sento pra assistir futebol sozinho. Quando muito, tem um ou dois amigos assistindo junto. Ou Manu, minha filhinha, correndo prum lado e pro outro e perguntando sobre qualquer coisa, contando histórias… Como boa mulher que é, está treinando para, quando mais velha, obter o PhD em corta-luz de televisão. Há alguma atração magnética, físico-química, quântica, holística que atrai as mulheres (mães, avós, tias ou até esposas – o maior perigo) para passar na frente da tv exatamente quando a bola vai entrar. Impressionante…
Mas não fiquem com raiva de mim, pois não é esse o ponto a ser discutido.
Na Copa do Mundo, você se senta pra assistir Suiça x Equador. Uma pelada horrorosa. Jogo comparável a América de Natal X Criciúma, com todo o respeito às agremiações, em termos de cores e de tradições no futebol brasileiro. Coisa que só você, apaixonado por futebol, se sentaria pra ver numa noite chuvosa de terça-feira.
Passa então alguém (qualquer alguém) pela sala:
– O que que é isso que você está vendo?
– América de Natal x Criciúma.
– Só você mesmo pra assistir uma coisa dessas. Não tem um filme melhor pra ver não?
Voltamos então ao Suiça x Equador. Você está sentado assistindo e o interlocutor do diálogo acima vem sentar-se ao seu lado e assistir animadamente a pelada da tv. E beber as besteiras que o locutor e seus afins estão derramando na transmissão, acreditando que estão ouvindo a mais pura verdade. Tudo isso complementado pelo noticiário, quase todo focado no futebol e, mais especificamente, no patriotismo de chuteiras. Começam então os comentários destrambelhados baseados nas verdades galvãobuênicas. E não param mais. Perdi as contas das vezes nessa Copa em que troquei a TV grande da sala por uma telinha de 30 polegadas e um pouco menos de besteiras e gritaria.
Sábado, jogo do Brasil, 2 a 0 comendo, atuação patética, esticam uma bola na direita para o Jô. Ele tenta coordenar suas oito pernas de polvo (lula lelé?) para dominar a bola. Solto um impropério qualquer pra afirmar que o sujeito não pode vestir a camisa amarela de forma alguma e que Felipão estava louco ao convocar tamanho pereba.
– Ah, mas tava dando raiva do Fred, que nem corria na bola. Esse daí tá jogando muito melhor!
A Copa do Mundo é um momento importante de contato do futebol com o “mundo exterior”. É enorme a quantidade de gente que não entende lhufas de futebol que passa um mês assistindo apaixonadamente aos jogos. É uma hora duplamente importante para o esporte, pois muitos torcedores de ocasião podem se apaixonar e passar a seguir seus clubes mais de perto.
As besteiras e inverdades com as quais já estamos acostumados no mundo do futebol, que já causam estragos mesmo entre a turma que acompanha e torce por seu time, têm efeito ainda mais devastador aos ouvidos dessa torcida sazonal. Não há, na grande massa torcedora de Copa do Mundo, nenhum senso crítico nem cultura para poder avaliar o que está ouvindo. Bebem e repetem aquilo que ouvem.
Isso sem falar nas novas armadilhas da modernidade.
Campanhas com trocas de mensagens carinhosas via rede social criadas por uma agência de publicidade para empresa patrocinadora. As mensagens foram espalhadas por milhões de incautos que acreditaram no que leram, quando foram na verdade inocentes úteis veículos de propaganda.
O que justifica que um jogador saia de um hospital com uma contusão grave na coluna e suba 100km de serra, pra depois sair de helicóptero (uti móvel) – de um conhecido patrocinador – pra Santos?
Nada. É como uma novela. Uma historinha de ficção que se nos é apresentada e que é, infelizmente, bebida pelo público. Então, o mal não é sentar pra assistir um jogo ao lado de gente que não respira futebol. O mal está na tv. E olha que eu tentei muito reduzir o mal aqui em casa, especialmente nos jogos do Brasil. Mas o vício fala mais forte. E os convivas exigem assistir à pior das transmissões. Para reclamar do chato. E beber o que ele diz. E repetir depois. Porque acreditam naquilo.
Fred não jogou nada. Mas virou bode expiatório. Enquanto isso, o cabeludo corta bola pra marca do pênalti, Julio Seven falha seguidamente… e tá tudo bem.
Esse é o futebol brasileiro. Segura que eu quero ver…
Panorama Tricolor
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