2014 não pode ser 1978 (por Walace Cestari)

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Um país inteiro com os nervos à flor da pele. As ruas em polvorosa e uma população dividida entre o escrete canarinho e o grito preso na garganta por um país melhor. E a seleção, de repente, voltou a ser a pátria de chuteiras. O hino, cantado à revelia do protocolo até o fim, traduzia um Brasil ideal, onze combatentes, a plenos pulmões, conduzindo o canto do fundo da alma de todo um estádio.

A seleção foi de uma hora para outra o retrato do país. E, como as ruas, mostrava-se nervosa, ansiosa. Passes errados diante de uma muralha vestida em toalhas de mesa de cantina suburbana. Gigantes croatas paravam as investidas brasileiras e impunham velozes contra-ataques. Em dez minutos, experimentamos o prólogo de uma tragédia clássica que se desenhava. Pés brasileiros empurravam, contra a vontade, a bola contra as próprias redes. Havia um clima de drama pesando sobre São Paulo.

Ainda que a seleção não achasse seu melhor jogo, houve um Neymar que brigava. E um chute. O tempo alongou-se e transformou-se em horas. A bola girava sobre seu eixo e acelerava tão somente a ansiedade de todos. As ruas reclamavam da situação de um país que avança em slow motion. A bola ia seguindo na mesma toada. Trancos e barrancos de um país que não sabe como gastar seu dinheiro. E a bola quicava quase desorientada no gramado. As bombas resumiam-se à repressão. No gramado, leve, morosamente ela tocava a trave e decretava o empate no placar.

E houve quem guardasse a esperança de um bom futebol para a segunda etapa. Entretanto, não foi o que se viu. Os gigantes voltaram com força e dominavam as ações do jogo. E, em uma daquelas injustiças que ocorrem ao futebol, foi-se toda a dedicação dalmática em um soar de apito. Em pênalti mais inexistente que o trem bala que ligaria as megalópoles do Rio e São Paulo, Neymar refugou e bateu para a defesa do goleiro. Como o script não agradaria aos deuses do futebol, em epifania explícita, o toque de mão do arqueiro europeu, não evitou que a bola encontrasse seu destino nas redes croatas.

Na frente no placar, virou o espírito, a desconfiança dos vira-latas que insistimos em ser. Veio a torcida e um time que lembrou de suas estrelas ao peito. Mas os ardentes do leste europeu não se entregaram facilmente, apesar de ver sua estratégia destruída pelo soar nipônico de um apito. Com força, empurraram o Brasil à defesa, que, em bela jogada de um garoto espetacular, ainda faria o terceiro gol, fechando de vez o livro de esperanças quadriculado que ainda tentava se escrever. De fato, os croatas mereciam um destino menos cruel. Mas justiça jamais rimou com futebol.

De súbito, ganhamos a partida. Contudo, ainda há a desconfiança. Uma ponta de insatisfação. Aquela mesma que desfila nas ruas. A estreia brasileira pareceu mais uma das obras inacabadas da Copa. Mas, vieram três pontos, bem-vinda vitória. Um retrato do país. O jeitinho, a fraude, o engodo. Nada disso nos tira a grandeza, apesar de nos amedrontar: não podemos transformar 2014 em uma nova 1978.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

Foto: http://esportes.r7.com/

1 Comments

  1. E ainda vem os argentinos quererem espinafrar o Brasil! Eles ganharam a Copa mais ROUBADA da história do futebol!

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