Ao longo desses 101 anos de Fla x Flu, muitos jogos foram decisivos; tivemos várias alegrias e, certamente, algumas tristezas. Faz parte da vida.
Algumas partidas foram tão marcantes que transcenderam a rivalidade local e não só se tornaram símbolos daquele que é o clássico mais charmoso do Brasil mas também verdadeiros épicos na história do futebol. Como o clássico do gol de barriga, por exemplo.
Está aí, aliás, o ótimo livro de meu amigo e colega Paulo-Roberto Andel, que não me deixa mentir.
De minha parte, fora os óbvios e inúmeros Fla x Flus nos quais se decidiram campeonatos a nosso favor, um ou outro me vem à memória por diferentes motivos. Ora por terem sido embates eletrizantes, ora por motivos pessoais.
Hoje gostaria de relembrar um jogo que, se por um lado não decidiu campeonato, por outro simbolizou a famosa superação tricolor frente a um adversário presumidamente superior e uma arbitragem desastrosa, como é típico acontecer no clássico.
O ano era 1997, época difícil para nós, tricolores, e em nossa equipe atuavam jogadores como Ronald, Roni, Alcindo e, destaques da partida, Yan e Nildo. Do outro lado, nomes como Fábio Baiano, Júnior Baiano, Atírson, Romário e Nélio.
O jogo foi emocionante e apenas por isso já seria digno de citação, mas o texto publicado no Jornal do Brasil na segunda-feira seguinte foi tão incisivo e me marcou tanto à época – talvez por destoar do que se divulga na FlaPress – que tomei a liberdade de reproduzi-lo abaixo, até para o leitor que quiser guardar a matéria como lembrança. Vale a pena ler até o final.
Saudações tricolores!
Em 21 de abril de 1997, assim descreveu João Carlos Pedroso, no caderno de esportes do JB, sob o título “Na bola e no coração”:
“O futebol é tão poderoso que pode derrotar, sozinho, quantos inimigos lhe aparecerem pela frente. O conceito aparentemente piegas foi provado em verde, vermelho e branco no Fla-Flu de ontem, no Maracanã. O Flamengo entrou em campo coberto pela tão falada empáfia rubro-negra, o juiz Léo Feldman errou feio, sempre para o lado do time da Gávea, mas a vitória de 3 a 2 foi do tricolor – um placar apertado no campo, mas uma verdadeira goleada na arrogância alheia e nos erros da arbitragem.
O mais engraçado é que o Flamengo ficou tão cheio de si apenas por ter empatado (1 a 1) com o Inter no meio da semana, em Porto Alegre, pela Copa do Brasil. Foi o suficiente para esquecer vexames recentes – como a derrota para os reservas do Botafogo – e não dar a devida atenção ao adversário. Afinal, o Fluminense era um time de Segunda Divisão, com alguns jogadores desconhecidos. ‘É mulambada, é mulamba…’ – gol do Fluminense, logo aos 6min. Rôni fez ótima jogada pela direita e cruzou para Alcindo, que teve tempo de ajeitar antes de bater.
Foi só então que os jogadores rubro-negros começaram a perceber que o Fluminense dava um baile dentro de campo. Yan mostrava o futebol vistoso e eficiente do início de carreira e Rôni, Nildo e o velho Alcindo enlouqueciam a defesa do Flamengo com jogadas de velocidade, criando novas chances de gol aos 9min e 10min.
O Flamengo só conseguiu esboçar alguma reação a partir dos 15min – Nélio aos 16min e Romário, aos 18min, tiveram oportunidades de marcar, mas aí descobriram que mais alguém estava em dia de gala: Adílson, o humilde goleiro do Fluminense. O time das Laranjeiras exibia uma alegria que só o Botafogo mostro até agora no Estadual – mas Léo Feldman resolveu estragar tudo, inventando pênalti numa bola cruzada por Fábio Baiano aos 24min e que apenas bateu na mão de Márcio Costa. Romário bateu e marcou. A torcida tricolor gritou: ‘Marmelada’.
Parece que o Fluminense voltou meio tonto – principalmente o lateral João Carlos que, logo aos 2min, deixou que uma bola cruzada por Atírson chegasse até Romário. O atacante dominou, driblou o mesmo João Carlos duas vezes e marcou o segundo gol do Flamengo. O time da Gávea passeou pelo campo até os 19min, quando Yan (ainda gastando a bola) perdeu duas boas chances. Dois minutos depois, Fábio Baiano foi expulso com justiça.
Mancuso entrou no lugar de Nélio para tentar recompor a defesa. No seu primeiro lance, fez falta. O Fluminense cobrou rápido e Yan lançou Rôni, que tocou para Nildo penetrar e empatar a partida, aos 24min. Na garra e com parte da alegria mostrada no resto do jogo – muito prejudicada pelo cansaço de alguns jogadores – o Fluminense continuou mandando no jogo. E mais ainda depois que Fabiano foi expulso aos 36min, também com justiça, por jogo violento.
Mais dois minutinhos e o Fluminense sacramentaria sua primeira vitória em clássicos no Estadual desde o histórico 3 a 2 que lhe deu o título de 95. Nildo arrancou pela direita e tentou cruzar. Júnior Baiano (que a torcida havia pedido para a Seleção momentos antes) cortou mal e devolveu a bola ao atacante tricolor, que tocou de canhota para o gol.
Foi o final justo para um jogo que começou com anunciado protesto contra as arbitragens – os times entraram de camisetas pretas e posaram para tradicional foto juntos. A má arbitragem foi derrotada pelo renascido futebol de Yan, pelo coração do time tricolor, pelo Fluminense ruim de marketing e bom de bola.”.
Gustavo Reguffe
Panorama Tricolor
@PanoramaTri
Po, que legal vc ter gostado dessa cronica.. abração